02/05/2008

26 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA



MORREU PORQUE ERA ARTISTA OU MULHER?
por Jean Sartief, Sânzia Pinheiro, Marcelho Gandhi




Em seu livro Paisagens do Medo, o geógrafo Yi-Fu Tuan, comenta que na contemporaneidade a maior ameaça, aquela que se destaca em uma cidade, são as outras pessoas. Segundo relata, a malignidade permanece como um atributo humano, não mais atribuído à natureza. Dentro desse processo muitos fatores são reforçados por um sistema global que favorece o aniquilamento do território, da memória, da liberdade, do tempo e do espaço, e principalmente, da ética.

Em 11 de abril, a artista italiana Giuseppina di Pasqualino Marineo, conhecida como Pippa Bacca, de 33 anos, foi encontrada morta, na Turquia, enquanto realizava um projeto artístico. Bacca estava, vestida de noiva, junto com outra amiga artista, perfazendo o trajeto da Itália para o Oriente Médio para celebrar a paz e enviar uma mensagem de casamento entre os povos e nações. O assassino confessou o crime e disse que deu uma carona para ela no dia 31 de março, data em que a violentou e a assassinou.

O fato chama atenção para o conjunto de percepções construídas dentro das vivências dos chamados territórios e de como as pessoas inseridas nesse contexto fazem parte de uma complexidade que não pode ser simplificada ou relativizada. O entendimento da realidade e a construção do espaço se passa, também, a partir da relação entre os sujeitos e o meio. Bacca acreditava em estabelecer relações de confiança, de integração, de vivência nas realidades locais partindo assim para percorrer países que passaram por zonas de conflito.

A ação da artista toca no processo de construção do “território” e de como a arte pode provocar percepções subjetivas não dimensionadas a partir das representações sociais, como acontece em muitas culturas. No oriente médio é comum ver noivas que vão para a cerimônia de casamento num estado de infelicidade. A arte provoca esses sentidos cotidianos que se reconfiguram em perdas e ganhos. São essas novas formas de apreensão e concepção do mundo as matérias-primas de muitos artistas que re-significam as idéias clássicas das relações entre arte, pessoas e o ambiente. Esse relacionar-se com a realidade gera oportunidades fantásticas de abertura ao novo, como também, depara-se com a brutalidade e ignorância quando a irracionalidade é a única forma de lidar com conflitos internos.

São esses medos do mundo, que criamos, que nos fazem prisioneiros de nossa própria armadilha. Os artistas colocam o dedo na ferida. Mostram-nos como criamos processos de rearranjos sociais individualistas e hipócritas que conduzem a uma compreensão irreal (ou atual?) do convívio em sociedade.

Será que ela morreu porque pegou uma carona que não devia ou porque era uma mulher exercitando sua fala ou ainda porque estava vestida de noiva, sozinha, com toda a carga imagética que pode gerar ou porque seu projeto era uma ofensa aos que preferem acreditar na guerra como meio de liberdade? A artista não conseguiu finalizar seu projeto e realizar a mensagem de paz entre povos, sendo ela uma vítima da violência que combatia, no entanto nos trouxe a ávida esperança e coragem de continuar acreditando na arte como essência da vida e da libertação.

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Acontece em Florianópolis (SC), de 19 a 23/08/08, o “17º Encontro Anpap - Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas”. Mais: http://www.anpap.org.br/
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A Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) está com inscrições abertas até 14 de maio, para o novo edital em artes visuais do Projeto Trajetórias 2008. Mais: http://www.fundaj.gov.br/
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Abertas até 06 de maio, as inscrições para o 12º Salão paulista de Arte Contemporânea. Mais: http://www.cultura.sp.gov.br/
publicado em 29 de abril de 2008

Um comentário:

Anônimo disse...

E quem disse que fazer arte não é uma atividade de risco??? hehehehe


Douglas Emen