26/01/2008

10 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA

AO POSICIONAMENTO CRÍTICO CRIATIVO - por Sânzia Pinheiro, Marcelo Gandhi e Jean Sartief

Poema Processo - Falves - 40 anos


Iniciamos o ano de 2008 com uma reflexão que se constitui no nosso desejo mais profundo para o desenvolvimento das artes visuais no Rio Grande do Norte. Para tanto trazemos o poema-processo. O que nos interessa nesse momento é a proposta, sua lógica, sua conexão maior porque, acima de tudo, ele tratou do posicionamento crítico criativo de uma geração que viveu conscientemente a transformação radical do cotidiano, das relações humanas e do espaço-tempo.


O movimento, que tem muito a ensinar aos jovens artistas contemporâneos, mergulha no vórtice provocado pelos anos 50 e 60, extinguindo-se em 1972, liderado por Wlademir Dias –Pino e lançado em Natal e no Rio de Janeiro simultaneamente.


O Brasil vivia um clima extremamente repressor ao mesmo tempo que incorporava ao seu cotidiano a máquina de xerox, a off-set, o mimeógrafo, o computador, a televisão (que ocupava um lugar na sala e passava a fazer parte da família) e a divulgação do uso de códigos não-verbais desenvolvendo a linguagem visual. Nesse período, em 1967, Ilya Prigogine, poeta da termodinâmica, traz ao mundo a teoria das Estruturas Dissipativas ou Teoria do Devir e defende uma metamorfose dos processos determinados para indeterminados; de reversíveis para irreversíveis.


É na direção desse espírito que os artista do movimento se vinculam. Entendem que a estrutura está em função do processo, subordinada a ele. É para a problemática do processo que se voltam. Rompem com a poesia tipográfica. Operam a cisão entre língua (palavra e estrutura) e linguagem (visualização do processo). Trata-se das possibilidades dos signos não-verbais.


Os poetas-processos questionavam o consentimento dos poetas discursivos em produzir sob a ação da censura e de utilizar procedimentos poéticos comprometidos e ultrapassados. Eles rompem com a palavra, mas não a negam, pois ao movimento interessa os novos códigos e os processos que são capazes de gerar. Poema/processo é aquele que, a cada nova experiência, inaugura procedimentos criativos. As informações podem ser estéticas ou não. Trata-se da luta histórica (dadaísmo, surrealismo, neoconcretismo...) do artista contra as estruturas fixas.


A realidade é a matriz que traz as possibilidades de evolução do processo e ocorre em todos os níveis, seja físico, químico, biológico, cultural ou semiótico. Inclui o desencadear dos objetos no tempo de consumo social. A obra deve instaurar novos meios de criação por relações mais amplas, como a teia da vida abre-se a cada instante e uma multidão de novos encadeamentos se realiza simultaneamente.


Não é o conteúdo da realidade que o poema/obra informa, mas o próprio processo dinâmico de atualização. Vê o leitor como um criador. Nega exclusividade ao poeta, lidando com a contradição entre a reprodutibilidade e criatividade: por um lado a reprodutibilidade é mantida; por outro, cada leitor ao explorar a proposta, cria suas próprias versões, instaurando novos caminhos. Todo poema deixaria aberta a possibilidade do leitor/observador criar a sua versão, manipulá-lo e interferi-lo.


Os muitos registros das obras desse movimento são projetos. Os teóricos compreendiam que o projeto liberava o artista das limitações materiais e permitia utilizar os meios técnicos disponíveis, dando ao artista o uso de várias áreas de conhecimento. Um antiindividualismo ao exigir trabalho coletivo, em que cada um mobiliza-se para fora dos limites de sua especialidade.


“"O importante é que sejam funcionais e, portanto, consumida. É preciso fundar possibilidades criativas" - essa afirmação de Moacy Cirne, sintetiza o compromisso e o objetivo desse movimento. Cremos que a melhor homenagem que podemos fazer é manter vivo o espírito dinâmico do poema processo e dessa forma, resultar numa produção da arte visual potiguar tão forte quanto a nossa própria história. Feliz 2008!


EM 01 DE JANEIRO DE 2008

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