26/06/2008

34 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA

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SOBRE COERÊNCIA TÉCNICO CONCEITUAL


por Jean Sartief, Sânzia Pinheiro e Afonso Martins


Cortejo com mais de mil pessoas na 10ª edição da Sonsbeek 2008


Na coluna anterior discutimos os equívocos conceituais existente nos eventos de artes visuais de Natal. Trazemos hoje um exemplo de coerência técnica conceitual em eventos de arte contemporânea. Trata-se da 10ª edição da Sonsbeek 2008, na cidade de Arnhem, Holanda.

Essa exposição internacional de escultura é uma das principais no mundo e tem cobertura brasileira pelo Forum Permanente.

Pode-se dizer que um dos pontos altos desta edição, cuja tema foi Grandeza, foi o fato de que antes das obras serem instaladas houve um cortejo onde cerca de 1000 pessoas entre moradores, artistas, estudantes, músicos, colaboradores que entraram em contato direto com a arte e os artistas carregaram, voluntariamente, as 26 obras, representativas a cada letra do alfabeto, que seguiram desde o centro da cidade até o Sonsbeek Park, local do evento. Ao final do dia, mais de 30 mil visitantes haviam compartilhado a grandeza da vida humana.

A curadora Anna Tilroe, crítica de arte e cultura, declarou que o feito foi objetivando algo maior: "Uma procissão é uma ferramenta poderosa para invocar uma experiência conjunta na qual as pessoas estão conectadas. Na Sonsbeek 2008, procissão tem um significado simbólico distinto: celebrar arte como símbolo da imaginação humana e conscientização social".

Esse momento no qual moradores e artistas estavam muito mais que momentaneamente situados em um mesmo espaço, é o catalisador de um desejo de coerência na qual a coletividade realmente é vista e respeitada. Há, nesse sentido, a busca verdadeira para o novo, o desejo real de que as coisas evoluam.
Segundo a curadora, a arte tem o poder de gerar novos caminhos revelando potenciais desconhecidos. "A arte pode revelar o mundo e nós mesmos de maneira renovada e cheia de possibilidades sem precedentes. Para nós, a dolorosa mas corajosa busca em transcender nossas limitações diárias é a Grandeza".

É esse movimento, essa força empenhada em prol de algo maior, nobre e presente cotidianamente e não aludida em manchetes de jornais, que não somente os artistas, mas toda a sociedade pode e deve usar a favor da coletividade e contra a tirania, contra os discursos vazios, as inaugurações de obras incompletas de políticos que criam uma sociedade do espetáculo, alienante e vazia.

A arte contemporânea tem um sério compromisso com a vida, mas como tudo, existe o sistema criado pelos humanos que têm um movimento singular. É preciso entender esse movimento como fez a curadora da Sonsbeek 2008. A procissão das esculturas tornou-se a procissão de nós mesmos em busca de nossa dignidade humana, de nossa grandeza, da descoberta de quem somos ou não somos.


CURTAS

Até 01 de julho seguem as inscrições para a convocatória internacional do AVLAB 0.1 de áudio e vídeo. Mais: http://medialab-prado.es/article/avlab_10
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Prorrogado até 30 de junho as inscrições de projetos culturais para a programação 2009 dos centros culturais do banco no Rio de Janeiro (RJ), em São Paulo (SP) e em Brasília (DF). Mais: www.bb.com.br/cultura
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Até 01 de julho segue inscrições para o Triangle France, residência artística de 3 a 6 meses, que tem como objetivo encorajar experimentos, mobilidade artística e intercâmbios.
Mais: www.lafriche.org/triangle
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Publicado em 24 de junho de 2008

17/06/2008

33 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA

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ARTE E NOVAS TECNOLOGIAS

por Jean Sartief, Sânzia Pinheiro e Afonso Martins

Ivan Sutherland abrindo caminho para as novas tecnologias

A interatividade, segundo Mônica Tavares, estudiosa da arte e das novas tecnologias e doutora em artes pela ECA/USP, pressupõe uma relação que garante ao receptor intervir instantaneamente sobre a obra. O próprio conceito de Interatividade nasce a partir de Ivan Sutherland, em sua tese de doutorado, em 1962, onde o usuário desenhava diretamente sobre um tubo de raios catódicos, visualizando as figuras imediatamente, gerando um processo comunicacional de reciprocidade.

No mês passado, houve a exposição comemorativa ao oito de maio sob o título de Interativos e não-contemplativos e, recentemente, foi lançado o edital 2008 do II Salão de Artes Visuais Prêmio Abraham Palatinik que visa difundir, fomentar, selecionar e premiar a produção artística no campo das artes visuais que se utilizem das novas tecnologias e novas técnicas aplicadas a arte. Ambos mostraram-se aquém quanto a seus resultados. No primeiro o saldo foi mais contemplativo que interativo e no segundo, levando em consideração o atual edital e os trabalhos da primeira edição, solicita-se, urgente, um aprofundamento.

Um salão que busca trabalhos artísticos em novas tecnologias já começa confuso quando o regulamento e fichas de inscrição são distribuídos em xerox que, neste caso, não se trata de um conceito ou forma de expressão baseada no equipamento, mas apenas na não onerosa reprodução. Seria um descuido? O regulamento segue com peculiaridades como o de solicitar expressamente “fotos reveladas em estúdio” ou em relação a um dos itens de avaliação dos trabalhos: “b) utilização de materiais e meios inusitados.” Não é mais sensato a utilização de meios tecnológicos? Outra coisa é que “meios inusitados” é um pouco complexo na arte contemporânea a partir de 1960. O que poderíamos chamar de meios inusitados?

As novas tecnologias também unem o espectador à obra pela possibilidade de retroação o que nos remete, igualmente, à questão da interatividade, lembrando que as obras, nessa premissa, são sensíveis a diferentes manipulações pelo observador. Trata-se de uma participação real e não mental. O apelo de soluções tecnológicas mais simples ou complexas segue com cada proposta artística, mas o objetivo é a perturbação direta pelo público. Uma participação que gera conhecimento pela experimentação dos processos artísticos, conforme menciona Edmond Couchot.

Se aqui existe essa dificuldade conceitual e prática, a pergunta é, conforme sugestão já proposta por Paulo Brusck (PE) e Diogenes (PB), durante a primeira edição do salão, por que não se investe em semanas de estudos e formação sobre a arte e as novas tecnologias? O resultado anterior do salão estava mais para a estética do precário do que para novas tecnologias. Um salão com ênfase na estética do precário seria muito bom! Esta proposta surgi com Hélio Oiticica , antes da arte povera e hoje Lisete Lagnado, discute o conceito de gambiarra que se aproxima dessa apreciação.

É necessário sintonizar-nos com as discussões teóricas e acontecimentos no Brasil e no mundo para não ficarmos apenas na festa. O positivo é que, no público da terrinha tem muita gente antenada, com um repertório atualizado, no campo da tecnologia mais avançada, apesar das instituições insistirem nos equívocos conceituais.


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Segue até 18 de julho as inscrições para a Bolsa Iberê Camargo 2008 com Bolsas no valor de R$ 8 mil.

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Até 01 de setembro segue as inscrições para o Concurso Mundial de Fotografia do Año Internacional de la Papa, promovido pelas Nações Unidas e a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). Mais:
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Um Olhar Sobre a Cultura Popular Nordestina é o tema do concurso de fotografia que faz parte do Programa BNB de Cultura 2008. Inscrições até 14 de julho.
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Publicado em 17 de junho de 2008

11/06/2008

32 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA


O DESEJO QUE FAZ DIFERENÇA
POR Sânzia Pinheiro, Jean Sartief e Afonso Martins

Detalhe do teto na exposição Desejos, de Andrea Ebert


A instalação é uma arte feita para um espaço específico, onde o objeto existe em cumplicidade com o espaço. O entendimento de site specific surgiu em decorrência das práticas minimalistas, do avanço das formas tridimensionais para o espaço puro e idealista do cubo branco, ou seja, o museu. Nalva Melo Café Salão, não é um museu, mas abriga Desejo, título da obra de Andréa Ebert, na qual é possível ver claramente o conceito de instalação.

Fugindo dos tradicionais espaços de exposição que algumas vezes carecem de estrutura, a artista preferiu explorar e brincar com as linhas geométricas espalhando suas instalações e seres – que ora lembram ginastas ora mergulhadores em órbita em uma busca ardente – pelos ares próprios do Salão/Café.

Antes da montagem a artista fotografou e estudou o lugar para dispor a obra que se configura em vários fragmentos que são espalhados num recinto delimitado para configurar sua totalidade. A relação dos objetos está na forma e no conceito. O observador vai explorando o espaço, descobrindo a obra e, esta lhe provoca uma agudeza de espírito. Há uma delicada surpresa a cada fragmento percebido; daquelas que só a realização de um desejo intenso é capaz de proporcionar.

Se as formas desenham sensações, as caixas de acrílico lacradas, que dão a ilusão de estarem iluminadas, problematizam as concretudes das cores, fruto da investigação da artista que questiona sobre o quanto uma cor pode ser palpável. Para a artista, "A cor do mar é não palpável, pois se colocamos dentro do copo ela desaparece. As flores do jambo se forem trituradas, perdem a cor de seu espaço. A cor do céu não é papável como a cor da terra. As caixas estão lacradas, como uma tentativa de tornar as cores concretas".

A exposição solicita do espectador uma quietude para, em seguida, mergulhar profundamente com muita elegância no universo de sentidos reconfigurados. É possível, também, perceber o conceito de Espaço em Obra, de Alberto Tassinari, no qual a relação dialética entre a substância física da obra e o meio circundante que inclui o espectador não deixa de implicar um "conteúdo" (que, de alguma forma, sempre será metalinguístico), mas nega-se a adotar as vias narrativas consagradas. Andréa coloca o espaço do Nalva Melo Café Salão em obra e deixa o espectador entrever o aspecto do processo criativo.

Se Caetano Veloso nos diz que “A gente não sabe o lugar certo de colocar o desejo ” é pelo fato de que o próprio desejo tem uma natureza diversa, colorida e assume múltiplos percursos. Andrea nos mostra isso sabendo muito bem onde colocar seus desejos e reforça a tese de Arnaldo Antunes ao afirmar que as cores como fenômeno se manifestam nas coisas.


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De 7 a 27 de julho, acontece em Bragaça Paulista o Festival de Arte Serrinha, que traz vários artistas convidados e um ciclo de debates e palestras. Mais: http://festivaldearteserrinha.uol.com.br/
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Até 11 de agosto seguem as inscrições para o Festival de Performance de Cali, na Colômbia, a realizar-se de 04 a 08 de novembro. Mais: http://www.helenaproducciones.org/
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O Diretório Acadêmico da EBA/UFMG torna público a abertura de inscrições de propostas para Residência Artística a serem realizadas por meio do Projeto ACasa, durante os dias 15 a 30 de Julho de 2008 em Diamantina/MG. Mais: http://www.eba.ufmg.br/da/acasa/

Publicado em 10 de junho de 2008

04/06/2008

31 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA

ARTE SITUADA
por Jean Sartief, Sânzia Pinheiro e Afonso Martins
Vídeo de Emily Jacir, onde trabalha temas como identidade, deslocamento e zonas de conflito.
Com base nos estudos de Kiki Mazzucchelli, crítica de arte independente e pesquisadora do Goldsmiths College, sobre arte situada, partimos nossas reflexões de hoje.

A arte como projeto parte da idéia de evolução de um conceito que privilegia as questões imateriais do trabalho artístico, a participação do espectador e permeia a questão temporal do trabalho. Pode-se dizer que seus primórdios estão relacionados a década de 20, com os ready-mades quebrando as questões das regras estabelecidas; passa pelos anos 60 com a arte conceitual aumentando a força questionadora dos parâmetros de valor da produção artística; chega aos anos 90, com os coletivos, curadores e o engajamento social, político, ambiental, tecnológico, científico, geográfico e explode no grande número de práticas e ações efetivas em torno do ambiente que circunda o processo artístico e que não está desvinculado dele, aos quais alguns pensadores denominam de práticas relacionadas.

Clare Doherty, em 2004, tornou conhecida a expressão arte situada, em seu livro “From Studio to Situation” (do estúdio à situação), descrevendo ações nas quais o contexto do trabalho é o ponto de partida para o artista e sendo assim, redefine a questão do espaço, inclusive do próprio contexto de site specific, que segundo os estudiosos já não dão conta das inúmeras possibilidades criadas pelos artistas.

O entendimento do ambiente, do espaço, da moradia, do trabalho, da área de lazer mudou. No século XXI buscamos agora vida no sistema solar o que redefine nosso posicionamento no universo. Esse olhar diferenciado para o lugar (entendido como site) o torna parte de um processo social, político, econômico, cultural etc e, assim, flexível. Surge a situação e o contexto como ponto de partida. O que era site specific evolui a novos conceitos: context specific, site-orietend, site-responsive. Essa diversidade de terminologias, influenciadas também pela interação com outras áreas como a psicologia, a história natural, antropologia, a arquitetura e o urbanismo, a teoria política, a sociologia, a filosofia etc, é englobada pelo termo arte situada.


Segundo Doherty, estar situado é estar deslocado, entendendo esse processo como uma “entidade mutável e fragmentada”, bem como utilizar não só um vocabulário com base no social, mas ações com base na mediação do artista nos contextos.


O crítico e curador francês Nicolas Bourriaud comenta das proximidades do modelo de alienação capitalista pós-industrial, pelas práticas e métodos estratégicos de mercado com as movimentações de mercado artísticas e as ações adotadas por alguns artistas. “Qual o propósito de se usar as formas do mundo dos negócios de se tomar relações humanas como modelo?”


Esses caminhos possibilitam ao artista refletir sobre o poder imensurável de criação dentro das realidades diversas locais e da interferência, influência, inspiração a partir das práticas coorporativistas globais móveis. Vem do artista a nova concepção, a vanguarda, introduzir aquilo que o público (ou críticos) rejeitam e tentam enquadrar como forma de discurso, mas nem sempre de entendimento. Algo que situa-se entre a formação e, ao mesmo tempo, a desestrutura da identidade. No entanto, tais práticas necessitam de tempo para amadurecimento e desenvolvimento de novas percepções.
nota:
A partir desta coluna, contamos com a participação do pesquisador e artista Afonso Martins na contribuição das fermentações visuais...

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Inscrições para o SPA das Artes Recife 2008 até 07 de julho. Mais: http://www.recife.pe.gov.br/
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Até 1º de julho, as inscrições para o programa de Bolsas de Investigação Jornalística para o Desenvolvimento Sustentável, parceria da Fundação Avina com a Casa Daros, tem nova categoria: Arte e Sociedade. Mais: http://www.avina.net/ ou celia.abend@casadaros.net
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Abertas as inscrições de 16 de junho a 04 de agosto para o XVII SABBART – Salão Brasileiro de Belas Artes / Ribeirão Preto. Mais: http://www.ribeiraopreto.sp.gov.br/
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Publicada em 03 de junho de 2008