23/04/2008

25 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA

COMPAIXÃO CÍNICA

por Sânzia Pinheiro, Jean Sartief e Marcelo Gandhi



Da Compaixão Cínica é o título de uma série de obra de Rodrigo Braga. O artista faz uso de pés de boi e de galinha e cabeça de peixe, esses elementos são fotografados com os pés, mãos e cabeça do artista.
Essas obras foram expostas na coletiva Paradoxos do Programa Rumos do Itaú Cultural 2006, que trazia também a obra Comunhão, série em que o artista comunga com um bode morto, ambos estão deitados e envolvidos por capim, em outra o artista nu se debruça sobre o bode e em outra está enterrado junto com o bode, cabeça com cabeça, como irmão, companheiros em um único destino. A curadoria da exposição do Itaú recebeu vários telefonemas de clientes indignados, ameaçando sair do banco, se aquela obra não fosse retirada, pois o bode estava morto.

Compaixão cínica é, também, a indignação de alguns quando se referem à obra do costa-riquenho Guillermo Varga Jiménez, conhecido por Habacuc. Em agosto, o artista expôs na galeria Códice, em Manágua, capital da Nicarágua, um cão de rua, passando fome. Sendo noticiado que o cachorro morreu de fome e de sede. A imprensa divulgou a morte do animal como um dos fatos mais chocantes em se tratando de arte contemporânea.

Crueldade? Sadismo? Houve uma petição mundial contra o artista que se inspirou no fato real de Leopoldo Natividad Canda Mairena, de 25 anos, que há 9 anos saiu da Nicarágua para tentar uma vida melhor na Costa Rica, país vizinho, e acabou como mendigo, sendo atacado por dois rottweileres, quando saltou um muro de uma oficina mecânica. Teve cerca de 200 mordidas e múltiplas perdas de pele, músculos, tendões, artérias, veias e nervos dos braços e pernas. Levado com vida para um hospital, onde passou por cirurgia e transfusão de sangue, morreu horas depois de uma parada cardio-respiratória.

Habacuc levantou a questão da hipocrisia, trouxe à tona essa compaixão cínica, ao colocar o cachorro que passaria despercebido na rua e ninguém se importaria se ele morresse de fome, numa galeria de arte ganhando atenção da mídia mundial. O cachorro não morreu e foi alimentado regularmente. Mas o assombro, a possibilidade de ter sido morto, foi maior do que a verdade expondo novamente a frágil superficialidade da mídia e da opinião pública perante o que é exposto, que no fim era a proposta do artista, já que desde o começo, havia em uma das paredes da galeria, a frase colocada pelo artista, “És o que Lês”.

Feito semelhante fez Yuri Firmeza, em Fortaleza ao se passar por um artista japonês, que ele mesmo criou e que iria expor no prestigiado Dragão do Mar. A curadoria, no caso Ricardo Resende a par de toda a farsa com o intuito de colaborar na discussão, colocando em xeque todo o sistema midiático e a falta de acompanhamento na produção artística contemporânea. Na ocasião, Yuri declarou: “Os jornais de hoje confirmam o descaso, comprovam que não têm seriedade. Seduzi os jornais do mesmo modo que eles seduzem o público. A obra é uma situação”.

Quanto ao uso de animais em exposições, isso não é novidade. Vários artistas os utilizaram em suas obras como Ligia Pape, Picasso, Damian Hirst e entre outros. Não se trata de uma legitimação ao citar esses artistas, mas de reafirmar que o animal, assim como nós, é mais uma forma de vida e entre as barbaridades que fazemos com eles está o inocente e legitimado ato de comê-los.

Será que o incômodo era a assepsia da galeria de arte, o animal, a morte? Ou se defrontar com a nossa natureza e vermos do que somos capazes? Pois nós não só matamos esses animais, como também os comemos de formas variadas de acordo com cada cultura!!!!!!!!!
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De 25 a 27 de abril, acontece em Olinda/PE o ArteCiência 2008. A inscrição e programação você pode conferir: http://www.arteciencia2008.com.br/

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Seguem até 22/04/08 as inscrições para exposições na Galeria de Arte da UFSC. Mais: http://www.dac.ufsc.br/

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A Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) abriu um edital para seleção de projetos, em diversas expressões artísticas, para participarem dos diversos festivais culturais do estado. Mais: http://www.fundarpe.pe.gov.br/.
publicado em 22 de abril de 2008

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