25/01/2008

2 - FERMENTAÇÕES VISUAIS - TRIBUNA DO NORTE - TODA TERÇA-FEIRA




GRAFITE: DA RUA À GALERIA


Em 2006, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) institucionalizou o projeto Grafite, que teve início em 2001, com o objetivo de valorizar a expressão e evitar vandalismo nos trens e estações da empresa. Segundo a CPTM, entre 2003 e 2005 houve uma queda de 42,1% nas ocorrências de pichações, enquanto que o vandalismo caiu para 62% no mesmo período. A empresa adotou políticas de parcerias com organizações não governamentais, artistas grafiteiros e ofereceu espaços para ocupação.


Este ano, durante as comemorações do centenário da imigração japonesa, a prefeitura de São Paulo, mais uma vez, saiu na frente em relação às políticas públicas em relação à arte urbana. Criou o projeto Olhar Nascente, no qual grafiteiros foram convidados a elaborar uma série de murais pela cidade celebrando e relatando através do grafite um resumo histórico da cultura japonesa – da religiosidade à alta tecnologia. Galerias como Choque Cultural e Fortes Villaça já há algum tempo abriram suas portas para o grafite, que já é chamado de novo muralismo brasileiro. Os grafiteiros são convidados para fazer cenários de desfiles de moda, fachadas de lojas, paredes de casas noturnas e decoração de apartamentos.


Fora do Brasil, um dos nomes pioneiros que se destacaram na década de 1980 foi Keith Harring, com uma temática urbana e homoerótica. Hoje suas obras valem milhões. No Brasil, a dupla paulistana Osgêmeos (escreve-se assim mesmo, tudo junto), Otávio e Gustavo Pandolfo – têm seus grafites espalhados por toda a cidade e tiveram suas obras participando de galerias no mundo todo.


O berço do grafite é o final da década de 1960, com a turma do bairro de Bronx, Nova Iorque (EUA), que estabeleceram esta forma de arte, usando tintas spray. Para muitos, o grafite nasce paralelo ao hip hop – cultura de periferia, originária dos guetos americanos, que une o RAP (música muito mais falada do que cantada), o "break" (dança robotizada) e o grafite (arte plástica do movimento cultural). Muitos grafiteiros europeus e norte-americanos ocuparam espaços alternativos e conseguiram mostrar suas obras além das fronteiras de seus países. Alguns exemplos desse movimento são: Jean-Michel Basquiat, Keith Haring, Banksy e Kenny Scharf.


Segundo Docinho, grafiteira natalense: “A pixação (forma adotada pelos pixadores, e não ‘pichação’, como manda a norma culta) é a raiz do grafite, que tem sua origem na antiga sociedade romana que utilizava carvão para escrever nos muros protestos, leis e até mesmo profecias. Daí surgiu a palavra graffiti, de origem italiana que significa ‘escritas com carvão’, desde então as pessoas usaram essa linguagem para repassar pensamentos e expressar suas idéias. Posteriormente, os artistas começaram a desenvolver letras e desenhos com cores e formas bem diferentes.


O grafite é usado para repassar sentimentos, mensagens pacíficas, ou a própria arte do escritor urbano (grafiteiro) e tem o objetivo de mudar o cotidiano das pessoas que trafegam pelos centros ou subúrbios da cidade, fazendo com que qualquer pessoa tenha livre acesso a arte em verdadeiras galerias a céu aberto”. E foi com essa intenção que Osgêmeos grafitaram trens nas capitais nordestinas, no primeiro semestre desse ano. Aqui em Natal, pintaram o trem que vai para Ceará-Mirim.


Ainda segundo Docinho, “O governo precisa investir mais na cultura e no que realmente chama a atenção da juventude. A cidade está poluída visualmente por propagandas de políticos, de empresas, cartazes de eventos e os mais diversos tipos de anúncios. Está na hora do governo adotar novas metas que realmente tragam efeito sobre a sociedade e resultados satisfatórios para ambas as partes”.


Para Gabriela Posada, argentina, criada em Pernambuco e residente em Natal, “Estamos em fase de fortalecimento da cultura hip hop potiguar, feita por jovens de diversas periferias da Grande Natal e interior, e nada mais óbvio e provável que algumas pessoas com pensamentos direitistas e caretas, queiram derrubar uma bandeira única e forte, que tem como base os descasos dessa mesma sociedade hipócrita que julga e condena atos de pura arte e protesto! Que é o grafite e a pixação!”


Gabriela, pergunta: ”como separar o pixo do grafite? Não podemos separar a origem (pixo) da atual arte visual crescente. Pois um não vive sem o outro! A assinatura do grafiteiro se chama tag. Então ao terminar um grafite, por mais colorido que seja ele virá acompanhado pelo tag! Esses rabiscos que pessoas tentam decifrar, pois têm dificuldade em ler a escrita! Fazem com que se sintam muito mal em ver as paredes antes branquinhas, como nossos colonizadores, ficarem mais significativas, ou seja, o pixo tem uma força de transmitir algo maior, mais ousado”.


Recentemente, até mesmo a academia abriu as portas para o Grafite. A Universidade de São Paulo (USP) começou a organizar a primeira cooperativa brasileira de grafiteiros, com o objetivo de "profissionalizar" esses artistas. O mesmo aconteceu no Rio de Janeiro.
Hoje já se fala em pós-grafite mas sobre isso, escreveremos numa próxima coluna.

Para saber mais:

· RAMOS, Maria Célia Antonacci. Grafite. Pichação e Cia. Ed. Annabulme: São Paulo.
· www.movimentohiphop1.hpg.ig.com.br/grafite.htm
· http://www.graffiti.org.br/
Em 06 de novembro de 2007

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